ADELAIDE, capital da Autrália do Sul.
Chegamos em Adelaide, de Canberra, no dia 12 de março, acompanhados por Michael
Walsh, da AIATSIS, e recebidos por Ghil'ad Zuckermann da Universidade de
Adelaide. Ghil’ad é um ser carismático, apaixonado e em eterno movimento, que tem
como missão espalhar na Austrália a boa nova da “revitalística”. O termo foi
criado pelo próprio Prof. Zuckermann, que acredita que a revitalização de
línguas é um campo interdisciplinar emergente que precisa de departamentos específicos
nas universidades. Só para ter uma idéia, Ghil’ad assina seus e-mails como:
Chair of Linguistics and Endangered Languages
School of Humanities
The University of Adelaide
Adelaide SA 5005, Australia
ghilad.zuckermann@adelaide.edu.au
Office: +61 8 8313 5247
Mobile: +61 423 901 808
http://www.zuckermann.org/
http://adelaide.academia.edu/zuckermann/
http://www.adelaide.edu.au/directory/ghilad.zuckermann
http://www.facebook.com/ProfessorZuckermann
Author of Revival Linguistics, Oxford University Press, forthcoming
Author of Israelit Safa Yafa (Israeli - A Beautiful Language), Am Oved, 2008,http://www.zuckermann.org/israelit.html
Author of Language Contact and Lexical Enrichment in Israeli Hebrew, Palgrave Macmillan, 2003, http://www.zuckermann.org/enrichment.html
Second Author of the Israeli Tingo, Keren, 2011
Editor of Burning Issues in Afro-Asiatic Linguistics, Cambridge Scholars, 2012 http://www.c-s-p.org/Flyers/Burning-Issues-in-Afro-Asiatic-Linguistics1-4438-4070-X.htm
Editor of Jewish Language Contact, Special Issue of the International Journal of the Sociology of Language, 2014
The University of Adelaide
Adelaide SA 5005, Australia
ghilad.zuckermann@adelaide.edu.au
Office: +61 8 8313 5247
Mobile: +61 423 901 808
http://www.zuckermann.org/
http://adelaide.academia.edu/zuckermann/
http://www.adelaide.edu.au/directory/ghilad.zuckermann
http://www.facebook.com/ProfessorZuckermann
Author of Revival Linguistics, Oxford University Press, forthcoming
Author of Israelit Safa Yafa (Israeli - A Beautiful Language), Am Oved, 2008,http://www.zuckermann.org/israelit.html
Author of Language Contact and Lexical Enrichment in Israeli Hebrew, Palgrave Macmillan, 2003, http://www.zuckermann.org/enrichment.html
Second Author of the Israeli Tingo, Keren, 2011
Editor of Burning Issues in Afro-Asiatic Linguistics, Cambridge Scholars, 2012 http://www.c-s-p.org/Flyers/Burning-Issues-in-Afro-Asiatic-Linguistics1-4438-4070-X.htm
Editor of Jewish Language Contact, Special Issue of the International Journal of the Sociology of Language, 2014
No dia seguinte viajamos para Whyalla, território Barngarla, na costa da
península Eyre, quase seis horas de carro.
No caminho de Wyhalla, com Gilh'ad em Port Germein
Wyhalla
Sabíamos que íamos assistir à fase
inicial de um projeto de revitalização, já que a língua aborígene não é falada
há décadas. Foi uma imersão na revitalização da língua Barngarla e a interdisciplinaridade
não faltou. Uma vez em Whyalla, soubemos que o Barngarla language reclamation é uma iniciativa paralela ao Native Title Reclamation, primeiro passo
para um longo processo que leva, quando bem sucedido, à concessão pelo Estado
(australiano) de “título nativo” incidente sobre uma terra que corresponderia a
um pedaço do território tradicional aborígene, no caso dos Barngarla. Lembramos
que não há direitos originários à terra (como definidos na Constituição
brasileira) e que trata-se quase sempre de terras já e definitivamente ocupadas.
Nossa primeira parada foi na escola primária de Hincks, onde os alunos
revelam a densidade da população aborígene no “hub” (aborígene) constituído pelas cidades de Port Augusta, Whyalla
e Port Lincoln: aproximadamente 40% dos alunos provêm de famílias aborígenes.
Anita Taylor, que se identifica como uma “Barngarla
girl” trabalha na escola há 10 anos e é o link entre esta e a equipe de
revitalização dedicada ao desenvolvimento de um projeto piloto para ensinar a
língua Barngarla.
O Prof. Zuckermann garantiu a disseminação da boa nova e, assim, nós nos
encontramos sentados em volta de uma fila de carteiras de escolar primária
muito bem arrumadas para que coubessem todos os visitantes (14). Além do team brasileiro e de Michael Walsh, representante
da AIATSIS, os outros eram representantes de instituições variadas, como DECD, The Children's University (a
Universidade das Crianças), a Universidade de Adelaide, o Mobile Language Team, e dois jornalistas de mídias veículos locais
e internacionais, além de Dawn, um ancião Barngarla, representando o BLAC, Barngarla Language Advising Committee. A
reunião foi aberta com muitas questões a serem discutidas pelo BLAC em sua
reunião fechada, e fotos de grupo para os jornais locais.
Seguiu o workshop “Barngarla language
reclamation”, com participantes vindo de várias cidades da região,
estudantes e representantes da Universidade de Adelaide e do Mobile Language Team. Com o objetivo de
obter a aprovação pelas comunidades, o Prof. Zuckermann introduziu o Barngarla
website, que inclui uma versão online do dicionário Barngarla (1884) com
ortografia atualizada e ferramentas de busca. Ele sugeriu que os participantes
aborígenes criassem novas palavras a serem introduzidas sobretudo para conceitos
decorrentes do contato e que não estão no dicionário de 1844. Esta mesma tarefa
já tinha sido iniciada em workshop anterior realizado em Port Augusta.
Barngarla Language Reclamation Workshop em Wyhalla
Em apresentações individuais, cada membro das comunidades presentes
expressou seu desejo de aprender a
língua e nos pareceu que a expectativa fosse a de que o workshop fosse dedicado
à aprendizagem da língua. Steve Atkinson (ótimo orador) levantou a questão de
que o essencial para os Barngarla seria aprender elementos básicos de sua língua
antes de começar a “making up new words
and getting confused (criar novas palavras e ficar confusos)”. Segundo ele,
as palavras que o Prof. Zuckermann (e seus estudantes) criaram e introduziram
em Port Augusta eram interessantes, mas que é preciso começar do começo antes
de iniciar atividades mais elaboradas.
O Prof. Zuckermann defendeu a nova ortografia por ele adotada para o
dicionário digital e falou brevemente sobre a sua adequação para falantes do
inglês como primeira língua, que é o caso dos Barngarla. Após apresentar alguns
tópicos sobre a pronúncia Barngarla, passou a alguns exercícios e andou pela
sala perguntando “Nina Yoowa?” (como você está?), típica saudação. Alguém perguntou a razão de usar entonação crescente em Barngarla quando
fazer uma pergunta, já que esta não parece ser uma característica tipológica de
muitas línguas australianas. A questão ficou em aberto para discussão em
futuros workshops. O Prof. Zuckermann nos convidou e também ao Prof. Walsh para
que falássemos sobre nossos trabalhos, antes de ir para a reunião do BLAC na
parte da tarde.
Uma semana apenas foi tempo insuficiente para abordar todos os problemas
não resolvidos do Barngarla Language Program.
Um longo dia de workshop e de discussão nos deu somente uma ideia do esforço
emergente. O jantar foi uma excelente ocasião para conversar informalmente com
os Barngarla e ter uma noção de sua vida em Port Augusta,Whyalla e Port Lincoln.
Ficamos impressionados com a determinação, força e a liderança das mulheres, e
sua capacidade de organização.
Mulheres Barngarla
E homens Barngarla
Anita Taylor
Golfinhos na baia de Wyhalla (voltando para Adelaide).
Voltamos para Adelaide
no dia 15 para um decepcionante “Spirit
Festival”, com workshops paralelos sobre línguas e artes aborígenes, mal
situados sob uma mesma tenda, enquanto uma música nada aborígenes tocava
ruidosamente do lado de fora. Muitos dos aborígenes que estavam por lá pareciam
compartilhar da mesma decepção, sentados na grama do lado de fora, na Victoria Square. O workshop sobre a
língua Kaurna, todavia, foi uma boa oportunidade para conhecer um pouco da
língua e conhecer Rob Amery, linguista que estava liderando as atividades.
Spirit Festival
No dia seguinte,
visitamos a sede do Kaurna Warra Pintyanthi Program, uma iniciativa
colaborativa que une os Kaurna, linguistas and voluntários que buscam ‘re-empoderar’
a comunidade Kaurna por meio da reclamation
e resgate de sua língua. Conversamos com várias pessoas: os linguistas Rob
Amery e Marianne Gail, os Kaurna (Steve Gadlabarti Goldsmith e Jack Buckskin), o
etnomusicólogo Chester Schultz, e o administrador Gerhard Kuula Rüdiger.
Marianne nos contou da sua vasta experiência no ensino da língua, nos cursos e
certificados TAFE e dos trabalhos com os Ngarrindjeri, inspirados pelo programa
de revitalização do Kaurna. Ela enfatizou a importância do treinamento e nos
deu muitos materiais sobre as línguas Ngarrindjeri e Pitjantjatjara. Jack, que
estreou o filme ainda não divulgado “Buckskin” é considerado um dos falantes mais
fluentes do revitalizado Kaurna. Ele tem ensinado Kaurna em high schools da SA e também em sua casa,
para a sua pequena filha. Steve, por outro lado, é responsável por um programa radio
semanal – Nanga Wanga – e trabalha na produção de vídeos como suportes
para a aprendizagem do Kaurna para comunidades e estudantes. Conhecemos também
Uncle Willys, um ancião Kaurna, que cresceu nas missões e trabalha com Rob
Amery desde os 1990. Ele falou de sua experiência na missão, da revitalização
da língua e nos deu noções sobre a natureza da educação aborígene tradicional: uma
aparente brincadeira com barbantes ou cordinhas é, por exemplo, uma metodologia
nativa para ensinar através da observação e da prática.
Materiais para a revitalização de línguas da SA
No dia seguinte, visitamos o escritório do Mobile Language Team, uma instituição
que apoia as línguas aborígenes em SA. Uma vez que a instituição se estabeleceu
na Universidade de Adelaide em 2009, um dos objetivos estratégicos é a sua
transição para o pleno controle dos aborígenes. Suas atividades vão da
documentação e preservação linguística à capacitação e contratação de jovens
aborígenes. Falamos com todos da equipe: Karina Lester, uma mulher Yankunytjatjara,
e Clayton Cruse, um homem Adnyamathanha, ambos aboriginal language workers que compartilham suas experiências com
muitas comunidades na SA; o diretor Trevor Buzzacott, e o Prof. Peter
Mühlhäuser, que depois nos levou para almoçar no Jardim Botânico de Adelaide e nos falou de seu trabalho como linguista no contexto
extraordinário da Ilha de Norfolk; e
Paul Monaghan, que já tínhamos conhecido no Barngarla
reclamation workshop.
Uma coisa ficou muito clara: a enorme importância da documentação
existente para o resgate de línguas (e não apenas). Há um esforço gigantesco na
Austrália para identificar, recuperar, arquivar e divulgar todas as fontes
documentais (notas, diários, listas de palavras, dicionários, gramáticas...), que,
na maioria dos casos, são os únicos suportes para recuperar (ou reinventar) uma
língua. Neste contexto, os missionários – na maioria protestantes, como
luteranos, presbiterianos, batistas – são ao mesmo tempo vilões e heróis, por
ter contribuído para o estabelecimento dos aldeamentos (missions) e a
evangelização forçada e em massa, mas, por outro lado, por ter deixado a grande
maioria dos registros linguísticos (e não somente) existentes.
Nos dias passados em Adelaide, o team
brasileiro e os representantes da AIATSIS (Michael Walsh e Doug Marmion)
realizaram três seminários, organizados pelo Prof. Zuckerman, para públicos
diferenciados na Universidade de Adelaide: nós demos um panorama da situação
dos povos indígenas no Brasil, e suas línguas; Michael Walsh falou da língua e
da cosmologia reveladas pelos cantos Murrinh Patha; Doug Marmion apresentou os
resultados do NIELS 2 (do qual já falamos). Nossa atividade final foi uma
conversa informal, extremamente interessante, durante um almoço com membros do
staff do Indigenous Language Support, o sistema que
financia os programas de apoio às línguas aborígenes da Austrália do Sul. Soubemos
que cerca de 10 milhões de dólares australianos são destinados anualmente, para programas e projetos de revitalização e manutenção de línguas aborígenes.
E nos dizem que é pouco.
Last but not least, Adelaide é uma linda e tranquila cidade,
muito verde, muito agradável. Visitamos a Artíndia de Adelaide: Tandanya. O Museu tem uma exposição deslumbrante sobre povos aborígenes. Saindo dela, fica para sempre a confirmação de que as populações nativas da Austrália - outrora consideradas como o elo entre Homo sapiens e Homo Neanderthalensis - alcançaram uma sofisticação tecnológica sem par para a vida de caçadores e coletores num ambiente não exatamente amigável, bem como uma arte-iconografia finíssima e de grande complexidade.
O Museu de Adelaide