sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Um pouco sobre as línguas australianas (ou aborígenes), por Bruna Franchetto


[Agradecemos Michael Walsh por ter disponibilizados seu artigo “Indigenous language maintenance and revitalisation”, a ser publicado em Harold Koch and Rachel Nordlinger (ed) Languages and Linguistics of Australia: a Comprehensive Guide. Berlin: Mouton de Gruyter].
Estima-se que havia cerca de 250 línguas aborígenes na Austrália quando dos primeiros contatos com os colonizadores. Destas, só sobreviveram cerca de 20 (incluindo 3 línguas crioulas), todas altamente ameaçadas. Há um amplo leque de situações: de um lado, a(s) língua(s) desaparecidas da Tasmania (o último falante morreu em 1905), do outro temos a vitalidade do Yolngu Matha do nordeste da Terra de Arnhem no Northern Territory. Há línguas extintas com pouquíssima documentação e as que estão sendo objeto de processos bem sucedidos de revitalização. O desaparecimento ou a vitalidade dessas línguas resulta da história do povoamento colonial em períodos diferentes.  As línguas que mais sofreram processos de obsolescência são as que eram faladas pelos primeiros grupos aborígenes a entrar em contato com os colonizadores, mas foram estas línguas as melhor documentadas. Há também um complexo arranjo de interações entre as línguas australianas, e também entre estas e o inglês e outras línguas, sobretudo asiáticas.
Houveram várias tentativas de inventariar as situações em que se encontram as línguas australianas. Uma delas foi através do Censo Nacional, realizado a cada cinco anos. Os dados resultantes do Censo apresentam problemas bem conhecido no Brasil: falta de reconhecimento de multilinguismo, super-estimação ou sub-estimação do número de falantes, entre outros. Marmion and Obata (2011; Marmion, Obata and Troy no prelo) realizaram um inventário nacional que deve oferecer melhores informações.
Considerável investimento por parte de órgãos governamentais (federais e estaduais) é dirigido à manutenção das línguas ainda faladas e à revitalização das que despareceram ou estão gravemente ameaçadas (http://www.anu.edu.au/linguistics/nash/aust/policy.html).
Referências
Marmion, Doug and Kazuko Obata 2011 The National Indigenous Languages Survey of Australia. AIATSIS seminar, 4 April 2011. http://www.aiatsis.gov.au/research/documents/Marmion404011.pdf
Marmion, D., K. Obata and J. Troy. in press. Community, identity, wellbeing: the report of the Second National Indigenous Languages Survey. Canberra: AIATSIS.

ProDocLin na Austrália


O Instituto Australiano de Estudos Aborígenes e das Ilhas do Estreito de Torres (AIATSIS, na sigla em Inglês – Australian Institute of Aboriginal and Torres Strait Islander Studies) e a FUNAI-Museu do Índio-RJ firmaram acordo de cooperação para troca de conhecimentos e experiências a respeito da documentação e proteção de línguas indígenas. A proposta começou a ser discutida em 2011 entre o então Presidente da FUNAI, Márcio Augusto Freitas de Meira, e o Embaixador da Austrália, Brett Hackett. O AIATSIS é a agência do governo australiano dedicada à pesquisa de questões indígenas. Informações adicionais sobre o AIATSIS podem ser encontradas no site (em inglês): www.aiatsis.gov.au

A primeira fase do acordo está acontecendo de fevereiro a maio 2014, com recursos da Australian Agency for International Development (AusAID) e com a viagem de três meses para a Austrália de três linguistas brasileiros ligados ao ProDoclin (Bruna Franchetto, coordenadora, acompanhada por Lívia Camargo e Rafael Nonato, pesquisadores de dois projetos ProDoclin). Eles estão baseados na capital Canberra, onde estão conhecendo a estrutura e o funcionamento do Aiatsis, bem como seus membros e as atividades diretamente vinculadas a iniciativas de revitalização de línguas aborígenes. Realizarão também viagens de campo para diferentes partes da Austrália participando de oficinas e eventos. O objetivo é divulgar informações corretas sobre a situação dos povos indígenas no Brasil com foco em suas línguas consideradas em termos de graus de vitalidade e ameaça a sua sobrevivência. Ao mesmo tempo, novos conhecimentos serão trazidos ao Brasil no que concerne as metodologias adotadas na Austrália para a revitalização de línguas nativas ‘adormecidas’, condição que, infelizmente, caracteriza a maioria das línguas aborígenes australianas. Por outro lado, o Brasil carece de qualquer política linguística, explícita e fundamentada, voltada para a preservação e promoção das mais de 150 línguas indígenas ainda existentes em seu território.
Bruna Franchetto (coord. do PRODOCLIN) e Livia Camargo (pesquisadora do proj.  YAWANAWA) conversam com o prof. aborígene da língua WIRADJURI na escola pública de Parkes - New South Wales, Austrália. 
(foto: Rafael Nonato)